O que você faria se alguém que você ama tanto te pedisse pra falar de tudo com ele, absolutamente tudo, menos sobre o AMOR?
Quem sabe você falasse do tempo, do clima, dos lugares que vc não visitou, de tudo que vc vivenciou ou não, da tua comida de ontem, da tua bebida de hoje, do teu tédio de amanhã, do teu MEDO da vida em qualquer época, lugar, situação...
Medo de dizer o essencial...
Medo de amar d+, talvez...
Mas AMOR não pode!
Não se fala, não se escreve, não se comenta de forma alguma sobre esse assunto...
Só se sente, só se ama em silêncio e... E é só!
É esse o ponto crucial da peça de câmera "Não sobre o Amor", que eu vi semana passada no CCBB.
A peça fala basicamente das cartas que o autor russo Victor Shklovsky escreveu para a sua Alya, uma mulher que nunca existiu.
Quem existiu, na verdade, foi Elsa Triolet.
Alya e Elsa seriam a mesma pessoa?
Metáforas não faltam nesse espetáculo, rola uma atmosfera de alucinações, idealizações, projeções, desejos, sonhos...
Mas isso não quer dizer que a coisa - cenicamente falando - fica confusa.
Mesmo quem nunca leu nada sobre Victor Shklovsky ou qualquer outro autor russo vai entender a peça direitinho.
Tá tudo muito bem estruturado na narrativa, feito por quem entende do traçado.
E quem assina a direção dessa peça é o Felipe Hirsch, da festejada Sutil Companhia, uma trupe que tem norteado os seus trabalhos com temáticas carregadas de nostalgia, recordações e saudades.
No elenco, Leonardo Medeiros e Arieta Corrêa.
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Nem há muito o que falar sobre o Leonardo Medeiros, né... Quem gosta de teatro e cinema sabe que ele é um puta gande ator e que, agora e finalmente, vem ganhando reconhecimento do grande público.
Além de arrasar no teatro, ele tá fazendo a novela do João Emanuel e, tb, tem protagonizado doze entre dez filmes bacanas do nosso cineminha brazuca.
Entre alguns desses filmes com o Leonardo Medeiros, tá em cartaz atualmente "Corpo", dirigido pela dupla Rossana Foglia e Rubens Rewald.
Ah, pra quem ainda não viu "Cabra Cega", eu só tenho a dizer que é um filme do caralho, com interpretações fantásticas, muito comovente, que se passa praticamente todo em um apartamento e mexe com os difíceis Anos de Chumbo que calaram o nosso país. Uma ferida que continua aberta, um tema que ainda tá longe de se esgotar seja na literatura, seja no cinema, seja no teatro, etc.
Mas isso são outros 500.
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Já a Arieta Corrêa...
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Bem, ela tá deslumbrante nessa peça. Sua personagem tem pouquíssimo texto, quase não fala, parece mais uma alucinação que anda e desanda por todo o cenário, o que cai de uma forma perfeitinha pra Arieta, uma atriz que fotografa muitíssimo bem.
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Eu sempre a achei muito bonita em cena. Arieta sempre me lembrou uma amiga minha, que tb é atriz e tão linda quanto a Arieta: a Luciana Cantom.
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Ambas têm traços fortes, carão quase quadrado, uma beleza andrógina, ambivalente, etérea...
Adoooro criaturas com essas características.
.Luciana, uma deusa, né?
E se estas criaturas forem atores e atrizes... Huuum, já me ganha de cara e pela cara. Quando são talentosas então, que é o caso de Luciana e da Arieta, aí eu já quero roubar pra mim... hehehe!
Mas me lembro de Arieta em "O Canto de Gregório" e "Antígona", do Antunes. Tb a vi em cena no tal Prêt-à-Porter do CPT. E sempre a achei uma atriz bem interessante.
Em "Não sobre o Amor" Arieta tá praticamente um quadro, uma pintura, uma natureza VIVA.
Ah, o figurino dela nessa peça é puro LuXo!
Arrasô, Arieta!!!
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Os cenários são de Daniela Thomas.
E nem é + novidade pra ninguém as peripécias cenográficas de Daniela juntamente com a galera da Sutil.
Acho que tb há algumas pessoas que só vão assistir os espetáculos da Sutil já imaginando o que eles vão aprontar no quesito cenografia.
Assim foi em "Avenida Dropsie", só pra citar um, com aquelas projeções incríveis de desenhos do Will Eisner.
E aquela chuva de dez minutos, hein?
Tipo Broadway, Cirque du Soleil.
Mas em "Não sobre o Amor", a movimentação que o cenário possibilita tb contribui pra dinamizar o espetáculo.
Até pq, sem esse cenário absurdo, a peça poderia até correr o risco de se tornar quase um monólogo chato de um cara que fala sobre tudo menos o que ele quer dizer realmente.
E não é o que ocorre, muito pelo contrário, pois o cenário de Daniela Thomas entra como mais uma personagem, tem a sua função dentro do conteúdo dramatúrgico da peça, que tb mexe com questões como a inadequação e a frustração, entre outras coisas.
A cama tá pregada na parede, a escrivaninha tá quase suspensa no teto...
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E o Leonardo Medeiros transita com desenvoltura por isso tudo, chega a dar vertigem em quem tá de fora.
Acho que essa movimentação toda - trepa aqui, sobe acolá - poderia até comprometer a atenção do público em relação ao que os atores dizem, o entendimento do texto em si. Mas isso tb não rola.
.O texto é belíssimo e me ganhou pela sua simplicidade e profundidade.
É meio literal SIM mas não pesa na boca dos dois atores.
Enfim, achei o texto muito bom, os 'causos' que a personagem central fala - ou inventa - para camuflar a sua solidão, é de uma poesia reveladora.
É muito fofa aquela história que ele conta sobre o japa que se apaixona pela faxineira da república de estudantes.
O final da peça eu tb gostei muito, com o fato de Alya chegar e dizer que leu todas as cartas de Shklovsky.
Seria tudo aquilo um sonho ou apenas uma alucinação, ou uma simples vontade de que tudo o que não se realizou de fato se transforme em realidade por um instante apenas?
Fica a dúvida (ou a certeza?). Mas uma dúvida/certeza que, mesmo sendo relativa, é absoluta pra quem deixa a imaginação fluir.
Ou, como eu li no programa da peça:
"A mulher que nega o seu amor é também a impossibilidade de voltar para casa, é a juventude e autoconfiança perdida, é a distância do que somos autenticamente, é a prioridade de olhar para o futuro quando nostos (a volta para casa) + algos (dor) nos adoece."
Pois é... Victor Shklovsky amou perdidamente, se perdeu nesse sentimento desconsertante, mas fez disso o motor de sua obra, escreveu sobre o desespero de uma paixão não correspondida. Correspondeu-se com a sua amada, sem escrever sobre o que sentia.
Mas, vendo a coisa por outro lado, o AMOR estava lá, nas ENTRELINHAS de suas cartas.
Era o que ele precisava pra viver.
E viveu.
Bela narrativa, bela obra, belíssimo espetáculo.
Eu amei!!!
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Vai lá!
Acho que rola até domingão, dia 6 de JULHO, o dia + incrível do ano... hehehe.
E eu só tenho + uma coisa pra falar (não é sobre o amor, é meu momento INDIGNAÇÃO!).
Acho que deveria ser PROIBIDO a entrada no teatro e no cinema - mas especificamente no teatro - de pessoas com a garganta inflamada ou qualquer coisa assim.
Tinha uma tiazinha no dia desta peça que não parava de tossir por um segundo sequer.
Se a desgraçada da velha não tivesse se mancado e não saísse do teatro depois de atrapalhar a metade da peça com a sua tosse de cadela tuberculosa, eu juro que ia botar essa criatura pra correr na base do ponta pé.
Ô, minha tia, se a senhora tá com a garganta inflamada, então enfia alguma coisa na boquinha (de repente até aquilo mesmo que a senhora não vê há tempos) pra aliviar a porra dessa tosse.
Ou, então, não vá pro teatro se estiver tossindo. Vai pra, sei lá... Se joga na Serra da Cantareira, na Serra da Mantiqueira, no Pico da Neblina, no RAIO que a PARTA.
Prooonto, passou o meu instante indignação!
Aliviei!!!
Vou tomar DORIL agora.
Fuiii!!!
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2 comentários:
meu... adoro teatro...
mas num entendo muito nao...
faz tempo que nao vou em nenhum... vou ver se dou uma passada em algum logo logo!!
adorei essa peça jah! muito fodah...
moh viagem!!!
em relação a velhos e velhas que vivem tossindo em concertos, espetaculos... sei lah!!! Que vão pro Raio que os Partam, sim!!!
=)
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