terça-feira, 20 de outubro de 2009

Alguém quer CARONA pra MISSA???

Um caso de PEDOFILIA intriga a cidade de Hamelin, em especial o rigorosíssimo delegado Monteiro.

Toda a imprensa está ávida pra apedrejar o grande culpado.

Mas não há provas contundentes contra o único suspeito, há apenas a palavra de um MENINO meio perturbadinho das ideias.


É essa a trama da peça “Hamelin”, do dramaturgo espanhol Juan Mayorga, que eu fui convidado pra assistir num desses finais de semana aê.

Protagonizado por Vladimir Brichta, essa peça se sustenta na ótima interpretação do eXcelente elenco de atores, todos eles com uma longa estrada na cena teatral, que ora interpretam personagens adultos, ora personagens infantis...

Mas a trama com essa pegada meo "policial", apesar de bastante envolvente, não é o ponto forte da peça.

O que me pegou mesmo foi a estrutura do texto, a forma como a peça é “montada”.

Tenho prestado muito a atenção nessa parte da estrutura textual de uma peça, até por motivos evidentes, já que tb sou dramaturgo e tenho pesquisado muito sobre a minha arte (agora, com o Núcleo de Dramaturgia Sesi-British Council bombando na minha vida, essas minhas pesquisas só se intensificaram).

E depois de ter lido no prefácio do livro “Para Trás e Para Frente”, do David Ball (livro essencial pra quem pratica a arte teatral), Michael Langham fala de um “hábito” que adquiriu quando trabalhou com um dos seus mestres no Birminghan Repertory Theatre, de Londres, e que consiste em imaginar a peça de volta ao seu texto original no exato instante em que ela está se desenvolvendo no palco (sem nunca, no entanto, ter lido o texto da tal peça antes).

Eu tenho pirado em cima dessa vibe, me perco percebendo a estrutura do texto enquanto assisto uma peça teatral e, tb, no que o dramaturgo colocou nas RUBRICAS que, por ventura, tenham sido ignoradas ou adotadas pelo diretor.


E o + bacana em “Hamelin” é que as rubricas do texto entram literalmente em cena.

E isso não é uma sacada do diretor dessa montagem, o André Paes Leme.

Tá lá, na própria estrutura do texto do Juan Mayorga (eu nunca li essa peça mas foi isso o que contou o Vladimir Brichta pra mim e pra outros amigos em comum após esse espetáculo em cartaz lá no CCBB).

Ou seja: a RUBRICA é um elemento fundamental nessa peça, entrando em cena, afirmando & reafirmando a AÇÃO das personagens.

Aliás, quase todo o elenco faz a vez do COMENTADOR, que é uma espécie de narrador que vai contando o que rola na rubrica...

Eu saquei isso quando um dos tais comentadores se refere ao TEMPO do teatro.

Achei muito legal essa presença da rubrica, ela sendo dita, destacada e até explicada para a plateia, às vezes até de uma forma didática d+.

Mas acredito que, por isso mesmo, essa coisa meio didática do texto só torna o espetáculo + vibrante, estabelecendo um diálogo direto com o espectador, quebrando a tal da “quarta parede”, enfim...

E até dá uma certa originalidade pra peça, acrescenta um algo a + em uma arte onde quase tudo já foi dito, feito e experimentado.


Os diálogos do texto são muito bem construídos, Juan parece dominar essa dinâmica, pois ora ele prende uma informação, ora ele solta, mantendo uma curiosidade de quem assiste e vai se envolvendo aos poucos com essa proposta investigativa da peça.

Tb há uma ironia desconcertante em torno de verdades construídas, o delegado apela pra uma guerrinha de nervos em suas acareações, fica repetindo sempre as mesmas perguntas, típico de quem quer alcançar uma verdade em cima daquilo que ele acha ser a verdade absoluta.

E, no final, vem a pergunta que não se cala nem a pau, Juvenal: mas, afinal de contas, qual é a verdade mesmo? As verdades são ou não são construídas ao gosto da freguesia? Ou simplesmente temos o poder de construir verdades em cima de mentiras que achamos convenientes e bem + fáceis de digerir?

Com essa peça, impossível não lembrar do finado Michael Jackson e daquela clássica história da Escola de Base aqui de Sampa, que marcou o noticiário braZuca nos Anos 90, onde neguinho jogou pedra na Geni antes de possuir qualquer tipo de prova sobre a autoria do crime e que, dias depois, tudo foi desmentido e os tais acusados - que tiveram suas vidas destroçadas durante o processo - foram inocentados.

Parece até que existe um prazer sádico em algumas pessoas de condenar os outros sem prova alguma.

Mas Freud deve explicar, pena que ele e o MJ já bateram as tamancas e devem estar curtindo horreres seus caldeirões tripleX lá naquele condomínio fechado e vipérrimo, o tal do Hades Village.


Voltando pra peça em questão, eu curti muito as luminárias espalhadas pelo cenário, que dão todo um CLIMA pra peça...

Os próprios atores acendem e apagam conforme a atmosfera da CENA, uma sacada muito bem bolada.

E a cenografia é minimalista, pouca coisa em cena, a peça se firma nas excelentes atuações.

Aliás, atores são muito bons mesmo, com destaque pro tal de Oscar Saraiva, que interpreta pai e filho, mandando muitíssimo bem principalmente no papel do menino que, segundo as investigações do delegado Monteiro, sofreu o tal abuso sexual de um pedófilo que sempre lhe oferecia carona pra MISSA.

No mais, “Hamelin” é uma boa peça, talveZ falte um pouco de ritmo, mas cumpre sua função, principalmente pelo texto que, como já disse antes, é bastante instigante.

Vladimir Brichta tb tá muito bem em CENA, longe daquele estereótipo que, infeliZmente, a televisão fez dele, do galã pegador, sempre mostrando o corpinho sarado & tralálá...

Nada contra um corpinho sarado, me gusta mucho, inclusive!

Mas, se o dono do corpo sarado tiver talento e, pelo menos, souber como se atua num palco, a gente jura que aplaude no final.

Até pq tens uns que se dizem ATORES por aê que só querem saber de fazer ponta em “Malhação” e, se vc perguntar pras essas criaturinhas toscas quem é BoB Wilson, eles acham que é alguma atração do Cartoon Network.

Só que esse não é, definitivamente, o caso do Vlad, que é um ator meeega talentoso assim como a maioria dos atores made in Bahia...

Nem da mulher dele tb que, aliás, é uma simpatia de pessoa e certamente vai arrasar na pele da estrela Dalva de Oliveira na próxima minissérie global!!!

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Medéia MONGA versus Jasão TESÃO

Na seXta, eu tb fui ver uma OUTRA tragédia clássica do nosso velho coleguinhas das antigas, ele mesmo, tio Eurípedes!!!

Mas, dessa vez, MEDÉIA é absurdamente transformada pelo povo do FOLIAS numa espécie de MONGA da pá-virada e, por isso mesmo, + insana, + vingativa e trocentas vezes + trágica do que aquela outra que CAUSOU horrores em Corinto.

E eu, que já gosto pra caralho de Medéia (leio e releio essa peça sempre quando acabo um namoro), curti + ainda essa versão tipo MONGA do Playcenter.E coisa funciona + ou menos assim:

A tenda do Folias é aberta pro público meia-hora antes da meia-noite, as barracas desse “circo notívago” já estão abertas muito antes da tal “neta do SOL” entrar em CENA surtando com a sua nada DOCE sede de VINGAÇA.

Personagens absurdos recepcionam uma platéia que, em princípio, não sabe bem o que faZer, estão todos apreensivos, pois se Medéia já é PIRIGUETE por si só, o que esperar de uma Medéia-Monga, nada songa, e ainda por cima acompanhada por típicas criaturinhas saídas da Noite do Terror do Hopi Hari!!!

Daí tem a barraca do E.T., a barraca dos irmãos SIAMESES que vendem beijos na boca (aki, siameses numa versão menino & menina, pra vc escolher se quer beijar desde o Brad Pitt até Angelina Julie, mas eu beijei os dois pq eu sou meio “tarado” por siameses, kikiki), a barraca da sereia tosca, a barraca do matemático perturbado, etc., etc., e taiZ!!!

Enquanto transitam por essas barraquinhas coloridinhas (a cenografia & os figurinos dessa peça são incríveis), os + ansiosos não deiXam de se perguntar:

E a tal da Medeia, hein?

Cadê essa criatura descompensada?

Será que ela foi se aconselhar com a Família Nardoni???

E dá-lhe uma BRÊJA pra acalmar os ânimos da plateia (sim, duas gurias ficam por lá vendendo cervejinhas geladíssimas & povo já caindo de boca na birita enquanto dona Medeia não dá as caras).

Mas eis que Medeia surge no palco principal, numa aparição totalmente MONGA, com todos aqueles truques de espelho e tudo + que uma mulher-FERA que se preze tem direito.Duas atrizes se “revezam” no papel da tal neta do SOL esnobada pelo Jasão Tesão...

Uma toda vestida de “amiga da ONÇA”, tigresa de unhas NEGRA e íris cor de MEL, que paga BOQUETE num pirulito tutti-fruti (na minha terra chamamos esse doce de CABEÇÃO e eu adorava chupar esse bagulho quando era KID, o que Freud até agora não conseguiu diagnosticar, pois meu caso é grave, broW).

Já a outra arrasta seus filhos pelos cabelos, uma mãe selvagem, louca pra se vingar e foder com a vida do seu Jasão Tesão.

Engana-se, porém, quem achar que, no meio dessa patacoada toda, Medéia não cumpre friamente a sua DOCE vingança.

Muito pelo contrário, a tal da Medeia-MONGA dá BAFÃO o tempo todo & toca o seu PUTEIRO em cima do tal Jasão-tesão.

E o fim dessa montagem do Folias é muito SEM noção, passei mal de tanto rir, Medeia cumpre o seu destino trágico, mas sem a carruagem de FOGO pra sua escapadela final.

Até pq essa Medéia-Monga é braZuca, velho!

Ou seja: nada de carruagem faiscando ou efeitos especiais de penúltima geração.

Afinal de contas, isso aqui não é cirque du soleil e fazer teatro no Brasil é quase uma jornada heróica, viu!E a nossa amiga Medéia, essa monga barraqueira, não quer saber + de papo com plateia nenhuma, manda todo mundo se foder, sair fora e ir pra casa do caralho ou por PQP, que ela tá com enXaqueca até na medula, pois matar filhote pra se vingar de marido não é como preparar nuggets no micro-ondas (HAHAHA).

No +, eu ADOREI, recomendo, prepare-se pra GARGALHAR bastante!!!

Ah, tb leve bastante moedinhas de 50 cent’s, que essa Medeia-Monga, o seu Jasão tesão & todas as outras atrações das tais barraquinhas circenses são beeem mercenárias e ninguém faz nada de graça ali, não senhor!

Levanta a cabeça, infortunada!!!

Lembro que quando fiz um curso sobre Tragédia Grega com a tia TEREZA MENEZES (a nossa querida teatróloga, dramaturgista e autora do imprescindível “Ibsen e o Novo Sujeito da Modernidade”), na hora do intervalo sempre rolava uma “zuação básica” entre eu & as meninas (Luciana Gonçalves, Bárbara Ismênia, Rita NiZZan, entre outras coleguinhas de oficinas teatrais) com essa marcante FRASE dita por HÉCUBA, a rainha vencida de um reino outrora conhecido pela grandeZa dos seus muros intransponíveis.

“Levanta do chão DURO esta cabeça, infortunada! Apruma teu PESCOÇO! Não mais existem TRÓIA nem rainha!”

E, deixando qualquer brincadeirinha de lado, devo diZer agora que me amarro muitíssimo nesse teXto toda veZ que leio, dos argumentos apresentados pelas personagens, do confronto entre a mater dolorosa Hécuba com uma impassível Helena de Tróia, além do sofrimento atroZ de Andrômaca e o desespero da perturbada Cassandra juntamente com todas aquelas mulheres aviltadas pela guerra.

Sei que grandes diretores braZucas já a encenaram mas, até seXta passada, eu nunca tinha visto nenhuma montagem – nem aqui em Sampa, nem em qualquer outra cidade do nosso planetinha pré-aquecido – dessa clássica tragédia do tio Eurípedes, o grande mestre em “exacerbar os sentimentos”.

Vi e gostei muitíssimo do que pude constatar pessoalmente na montagem assinada pelo diretor Zé Henrique de Paula, em cartaZ ali no Teatro Sérgio Cardoso.

“Quantas razões eu tenho para CHORAR nesta calamidade a PERDA de meus filhos, meu marido, minha querida PÁTRIA... Ai de mim!”

Tudo bem que eu até já tinha algumas informações de que, nessa peça, o diretor transpôs toda a tragédia de Hécuba e cia. pros campos de concentração nazista da Segunda Guerra Mundial, que o elenco aprendeu alemão e trálálá...

Mesmo assim, essa montagem conseguiu me surpreender, me tocou profundamente, não sei se por causa de minhas raíZes que tb tem um pé fincado naquelas bandas largas do Oriente Médio...

De qualquer forma, o que eu vi em CENA foi um puta trabalho de encher os olhos (literalmente), coisa de gente GRANDE, que sabe o que faz, com uma entrega visceral de todo o elenco, totalmente dentro da proposta do espetáculo...

Resumo da MELOPÉIA: “As Troianas”, do Núcleo Experimental, tá INCRÍVEL, uma peça teatral do tipo imperdível, muito FODA mesmo!!!

“Aproximo do chão meus joelhos doloridos e golpeio a terra com as mãos antes fortes fechadas!”

No início dessa montagem, rola uma projeção de uma cena entre Poseidon & Palas Atena no melhor estilo “Casablanca”...

Logo depois, as tais “troianas” – que nessa montagem, como já disse antes, são JUDIAS – chegam descarregadas como animais do vagão de um trem e enfrentando toda a perversidade de soldados nazistas.

E, mesmo sendo totalmente falada num idioma que não dominamos, essa peça consegue nos comunicar fluentemente porque trata de uma temática universal, trata da dor da PERDA.

E a compreensão fica melhor ainda pra quem já leu essa tragédia, dá pra identificar facilmente cada uma de todas aquelas viúvas cativas que surgem em CENA.

“Levai-me, conduzi-me na marcha FORÇADA. Comecemos a triste JORNADA até nosso CRUEL cativeiro!”

Ah, a cena da caiXinha de música, com uma das atrizes dançando balé no vagão, é realmente de se tirar o chapéu...

Tb a cena do menininho que faz o Astiânax, filho do Heitor com Andrômaca, é muito comovente...

O menino parece ter saído daquele filme “A Lista de Schindler”, sei lá, um filme que eu vi com o coração faZendo biquinho pra não desaguar no choro (sou EMOtivo meeesmo, eu assumo meus defeitos, e totalmente trágico tb, buáááááá).

Portanto, leve o seu LENÇO com rendas de bilro que eu aposto que vc vai sair dessa peça meio desidratado de tanto lacrimejar.

Isso mesmo, rola uma CATARSE final, ou até mesmo uma reflexão fodida sobre a tal da INTOLERÂNCIA, essa porra devastadora que nos ataca diariamente e que só a percebemos quando torres siamesas são derrubadas por aviões-bomba ou quando guerras mundiais acontecem, espirrando sangue no nosso quintal.

Pois como diria o tal judeu da CRUZ: “perdoai-vos, Senhor! Eles NÃO sabem o que fazem!”

Ou sabem???